III
Castelo dos Desejos.
Ele caminhava rapidamente, e ela mal conseguia acompanhá-lo.
- Estás machucando o meu braço – disse ela, quase sendo arrastada.
- Eu não quero te machucar, mas vejo que será necessário. E não estou falando do braço...
Durante todo o caminho, apesar da dor que sentia, ela se manteve firme em seu propósito: não ceder aos desejos dele. O caminho era longo. Muitas escadas foram descidas. Ele percebeu que a força da sua mão deixava marcas no braço dela, mas mesmo assim a ira que sentia não diminuiu, e apertava ainda mais a mão quando via em seus olhos que ela realmente não o queria.
Ser rejeitado era um sentimento que ele jamais havia sentido. Usar de força era a sua opção no momento, e, de tanto usá-la, ela nem sentia mais dor. Seu braço já estava dormente quando chegaram a um imenso corredor frio, escuro e estreito. Eles passaram por algumas portas durante o trajeto. Ao fazer a primeira curva, ele desacelerou os passos. Ela olhou em seus olhos, quando pararam diante da última porta, no fim do corredor, e sentiu medo quando ela se abriu sozinha, dando lugar a uma escadaria.
Olhando para baixo, ela avistou uma pequena luz vinda de uma única tocha acessa, presa à parede. Começaram a descer os quarenta e cinco graus em direção ao subsolo. O frio aumentava à medida em que desciam. Algumas tochas se acenderam, dando-lhe a verdadeira dimensão do lugar. Sentiu que ele realmente não estava brincando quando, ao descer o último degrau, avistou correntes e chicotes presos à parede. Ele soltou o seu braço, fitou nos seus olhos, e disse, com voz firme:
- Agora saberás o que é tortura.
- Estou com frio.
- Tira a roupa!
- Mas está muito frio aqui.
- Vais me desobedecer outra vez?
Não precisou pedir novamente. Diante de seus olhos, ela se despiu o mais rápido que pôde. Nua, sentindo-se humilhada, não imaginava o que estava ainda por vir. O frio congelava o seu corpo e o seu queixo não parava de bater. Começou a vestir-se. Ele imediatamente gritou:
- Quem mandou tu te vestires?
Ela se assustou e largou a roupa no chão. Neste instante ele a tomou pelas mãos e prendeu seus pulsos na grossa corrente suspensa no teto. Braços levantados e imobilizados, corpo livre para ser tocado, ela não se deixou abater, e perguntou:
- Vais me chicotear?
- Bem que tu merecias, mas o teu castigo será pior.
Ele se colocou à sua frente, fitou seus olhos, e começou a passar as mãos pelo seu corpo. Ela chutou as pernas dele. Ele se afastou, tirou-lhe as correntes e disse:
- Deita na cama.
- Que cama?
- Aquela ali – respondeu, olhando para o lado.
Ela aproveitou o instante de distração e não pensou duas vezes: subiu as escadas correndo. Quando ela se aproximou da porta, todavia, esta se fechou. Procurou em vão a maçaneta, mas não havia maçaneta. Começou a chorar. Em tom autoritário, ele lhe disse:
- Só sairás daqui quando eu quiser!
Nuvens negras pairavam sobre sua cabeça. Aflita e inconsolada, por alguns minutos ela relutou
- Estás com frio?
Ela não respondeu, e olhou-o com desprezo.
Ele tirou a capa, depois o restante das roupas, e deitou-se, nu, sobre o corpo dela. Sussurrou ao seu ouvido, maliciosamente:
- O frio está passando?
Ela virou o rosto para o outro lado.
Ele expressou raiva ao dizer:
- Mesmo diante da situação, tu ainda me desafias?
Ela tentou inutilmente se soltar. Ele entrelaçou os braços sob o seu corpo, trazendo-a para perto dele alguns centímetros acima da cama. Ela sentiu o seu pescoço, os seus seios e as suas pernas serem sugadas, e gritou:
- Não! Eu não quero!
- Mas eu quero – ele disse, passando os dedos pelo seu sexo.
- Não, por favor! Eu te imploro! – disse ela, chorando.
As lágrimas que rolavam pelo rosto dela deixaram-no sem saber ao certo o que fazer. Irritado, tentou ainda prosseguir. Ela lutou, voltando-se de um lado a outro. Ele finalmente a soltou, levantou-se e, enquanto a desamarrava, disse:
- Tenho que receber meus convidados. Mais tarde eu volto.
Jogou as roupas dela em cima da cama, vestiu-se e subiu as escadas. A porta se abriu para deixá-lo passar, e fechou-se outra vez atrás dele.
No caminho de volta, ele encontrou a criada, e ordenou-lhe:
- Leva ao calabouço um cobertor e comida. Depois da festa eu descerei para ver se ela está disposta a cooperar.
- Em que calabouço ela está?
- O meu pensamento te guiará. Não se preocupe com a porta, ela se abrirá e fechará na medida em que te aproximares. Peça ao mordomo para te acompanhar.
Assim a criada assim o fez. Levou um cobertor de pele de coelho, pois sabia o frio que habitava naqueles porões, pediu ajuda ao mordomo e, juntos, levaram comida e agasalho o suficiente para que ela não se sentisse tão desprotegida. Ao ver a criada, ela correu ao seu encontro.
- O que foi que a senhorita fez para levantar a ira dele? – perguntou-lhe a criada.
- Disse que não iria à festa.
- E a senhorita quer ficar aqui?
- Não...
- Então, acho melhor te comportar e usar da tua inteligência.
Antes de sair, a criada pediu-lhe que comesse e se aquecesse debaixo do cobertor.
- A senhora tem que ir agora?
- Sim.
- Então irei junto – disse ela, levantando-se.
- Acho melhor permaneceres aqui. Senão, além da senhorita, eu também serei castigada.
Para proteger a criada, ela desistiu da fuga. Permanecer naquele lugar sombrio e gélido, onde o calor do sol não habitava e a luz dos dias jamais foi convidada a entrar...
Sentada na cama, acuada, observou tudo ao seu redor. As correntes faziam-na visitar a negritude da sua imaginação, e ouvir os gritos de dor de corpos chicoteados. O medo a fez permanecer acordada. Todavia, seus olhos começaram a pesar com o passar dos intermináveis segundos. Foi vencida pelo cansaço, acordando somente ao escutar o ranger da porta se abrindo. Pensou em ceder os seus encantos, a fim de acabar de vez com tudo aquilo.
Ele desceu os degraus rapidamente, chegando diante dela como num piscar de olhos. Não foi preciso perguntar nada. Ela sentiu o desejo ainda presente no olhar dele. Lembrou-se do conselho da criada, mas a recusa era maior, e deixou estampado em seu rosto o desprezo que sentia por aquele homem. O seu corpo, entretanto, obedeceu ao comando do seu olhar. Paralisada, sentiu os olhos deles percorrer todo o seu corpo estremecido Ele se aproximou. Sentiu o hálito dela através de um quase beijo. O coração da jovem disparou. Ele tirou a capa e se posicionou atrás de suas costas, sussurrando ao seu ouvido:
- Tira o vestido.
Hipnotizada, ela começou a se despir. Sentiu a respiração dele aquecer a sua nuca.
Novamente um comando:
- Tira tudo!
Ela respirou fundo e obedeceu.
Ainda atrás dela, ele beijou seu pescoço, e sentiu, através de suas mãos, o corpo dela se arrepiando a cada toque.
- É assim que eu gosto e quero te ver e sentir: obediente – ele informou, tocando o corpo dela. Voltando-se, ficou frente a ela e sentiu, mais do que viu, todo o desprezo estampado na expressão do seu rosto. Disse, furioso:
- Pensei que a tua permanência neste calabouço mudaria os teus atos. Vejo que terei que te punir de verdade.
Amarrou então os seus braços e suas pernas em correntes pressas à parede. Fixou o olhar em seu corpo, possuindo-a com os olhos. Como um animal faminto, devorou o corpo da jovem com a boca. Ela, por sua vez, permaneceu como uma presa morta, imóvel, sem reação. Um verdadeiro ritual de tortura.
Tê-la naquela situação excitava-o. Era necessário que impusesse sua autoridade no momento, mas não era menos excitante do que tê-la ali, nua e sujeita a tudo. Pensou que, ao humilhá-la, romperia as barreiras da sua resistência. Ledo engano! Comprovou a firmeza de propósito da jovem quando, ao tirá-la do transe, ela reagiu sem pensar nas conseqüências, dizendo:
- Isto que estás fazendo comigo é covardia! Não é um ato digno de um homem!
Após despejar a sua revolta, pensou que seria chicoteada por confessar a sua repulsa. Ficou esperando a reação dele. Os seus olhos a denunciavam, dizendo que se encontrava amedrontada. Todavia, indignada.
Ele foi pego de surpresa. Não sabia como lidar com ela. Ficou por alguns segundos pensando o que ela tinha de diferente das demais jovens, já que o seu charme, o seu poder de sedução e o seu título de nobreza sempre foram disputados pelas mais belas mulheres, daquele reino e fora dele. Por que justo ela o deixava sem saber como agir? Se ela era apenas mais uma dentre tantas que já tivera, então por que a sua recusa mexia com ele? Sentia-se atraído, isto não podia negar. Não só pela beleza que possuía, mas por sua determinação em recusar os toques de suas mãos em seu corpo. Ao provar deste novo sentimento, que mexia com as suas estruturas, aliado à raiva que sentia no momento, proferiu as seguintes palavras:
- Vou te mostrar o que é covardia!
Começou a se despir. Acenderam-se tochas, clareando os dois corpos. Nu, ele entrelaçou os braços em sua cintura e encostou seu corpo ao dela. Beijou sua boca. Ela serrou os lábios e virou a cabeça para o outro lado, em sinal de negativa. Ele segurou seu rosto com as duas mãos e tentou outra vez roubar-lhe um beijo. Ela repetiu o ato. Ele disse:
- Então não queres me beijar?
Em seu olhar, ela deixa claro que não o deseja. Maliciosamente ele diz:
- Vamos ver se me beijas agora.
E novamente a beijou, só que, desta vez, encostando umas das mãos entre as suas pernas. Quando o seu sexo foi tocado, ela retribuiu o beijo. Ele encontrara seu ponto fraco. Ele se afastou e sorriu. Ela diz:
- É fácil se aproveitar de mim. Estou amarrada e impossibilitada de agir conforme meus desejos.
E acrescenta:
- Tu não és homem.
Neste exato momento, o sorriso se desfez no rosto dele, e sua testa se franziu. Soltando as correntes que a prendiam, ele respondeu:
- Estás enganada. Sou homem, sim, e vou te mostrar.
Ele se aproximou. Ela deu um passo atrás. Ele se aproximou novamente. Ela o encarou e não se moveu. Ele a tomou nos braços e forçou um beijo. Ela tentou empurrá-lo. Uma batalha foi travada entre os dois. Quanto mais ela tentava fugir, mais ele a desejava, tornando a caçada interessante e excitante!
Assim ele a visualizara: uma presa
Ela sentia calor, devido à força que precisava fazer para tentar fugir de seus braços, e também sem forças diante de tanto esforço. Restava apelar para as palavras, e não pensou duas vezes ao dizer:
- Não, por favor, não!
Ele, por alguns minutos ainda, permaneceu em cima de seu corpo, sugando-o e alisando-o por inteiro, fingindo não escutá-la.
- Não! – insistiu ela, chorando.
Ele fez uma pausa, soltou-a e disse:
- És presa fácil para mim. Não adianta fugires. Vou tê-la quando que eu quiser. Mas antes brincarei um pouco. Estou gostando desta situação, ou melhor, dessa competição.
Enquanto dizia isto, ele voltou a amarrá-la na cama.
- Vou te deixar aqui para pensares mais um pouco. Voltarei todos os dias e terás o mesmo tratamento até que decidas te entregar.
- Morrerei de frio, nua e amarrada.
- Não morrerás – disse ele, vestindo-se.
Ao subir as escadas, todas as tochas outra vez se acenderam por si mesmas, aquecendo o lugar, amenizando o frio do cativeiro.
Chorar parecia ser a única solução no momento. E assim ela ficou, até o dia seguinte, entre choro, fome e medo.
Chegara a noite lá fora, mas a escuridão no subsolo não permitiu que ela visse o caminhar do dia. A porta se abriu. Ela sabia que iria sofrer por horas diante dele. Ele desceu os graus, vestindo a sua capa preta. A cada passo em sua direção, o corpo dela tremia de medo.
Ele desceu apressado, sabendo que ela permanecera ali como a deixara. Nua, acorrentada à cama. Parado diante dela, fez com que levantasse o rosto, e deslizou as mãos pelo seu corpo. Ela tentou se desvencilhar, mas as correntes machucavam seus pulsos e seus tornozelos. Em um mero fio de voz, ela implorou:
- Não, por favor, não!
Ao tocá-la, ele sentiu que seu corpo estava quase congelado. E ficou observando-a. Aquele olhar amedrontado modificava os seus planos. Vê-la acuada e desprotegida sobre a cama era algo que não lhe causava prazer. Gostava de presa difícil, e não tão fácil como ela naquele momento. Aproximou-se mesmo assim, e beijou os seus lábios tão gélidos quanto o desejo dela em relação a ele. Sentiu que ela havia retribuído devido apenas às circunstâncias. Mas continuou e desceu os lábios pelo seu pescoço. Ela tremia. Tentou tocar seu sexo. Ela fechou as pernas, trancando a sua mão entre as coxas.
Sem deixar que ela percebesse, pela primeira vez ele havia gostado da sua reação. Um olhar de incompreensão nasceu nos olhos cansados dela, ao vê-lo ali parado, observando-a com uma ligeira expressão de satisfação. Surpreendeu-se quando ele a libertou das correntes e a pegou no colo, enrolando-a no cobertor e carregando-a lentamente escada acima.
Sentir-se protegida em seus braços contrariava toda a repulsa vivenciada naqueles últimos dias. Mas era exatamente assim que ela se sentia - protegida. O calor do corpo dele fazia uma barreira contra a corrente de ar gelado que circulava no ambiente. O ritmo descompassado do coração da jovem anunciou a esperança de melhores momentos. Quanto ao coração dele, pedia para se apressar. Caso contrário, ele a perderia para sempre.
Assim subiram até o quarto dela. Uma promessa de mudança pairava no ar, como se a esperar um milagre nos instantes seguintes. Fragilizada, desmaiou em seus braços. Ele ficou desesperado e tentou reanimá-la, colocando-a dentro da banheira de águas cálidas. A sua ajuda era crucial diante de tal circunstância. Sentia medo só em pensar que poderia perdê-la para a morte. Seria uma situação patética, pensava ele.
Entrou na banheira amparando-a para que não se afogasse, já que se encontrava inconsciente. Ficaram na água apenas alguns momentos. A intenção era normalizar a temperatura de seu corpo. Secou-a rapidamente, e levou-a à cama, deitando-se a seu lado embaixo do cobertor.
A criada entrou o quarto, e ele lhe pediu que providenciasse imediatamente uma sopa e uma xícara de chocolate bem quentes. Durante a espera, ela murmurava palavras sem sentido. Entrara em estado de puro delírio. Ele procura utilizar seus poderes, e colocá-la em transe, a fim de ganhar tempo até a criada voltar. Os segundos pareciam horas, horas de puro tormento. Quando a criada retornou com a bandeja, ele respirou um pouco aliviado.
A criada fechou todas as janelas, acrescentou lenha à lareira, e, enquanto isto, ele tentou reanimar a donzela levando-lhe comida à boca. Uma tarefa difícil, já que ela estava desacordada. Ele precisou testar a sua força de vontade, aliada à paciência, a princípio apenas encostando o líquido nos lábios dela, e forçando-o boca adentro, quando ela, em seu delírio, entreabria os lábios. Aos poucos, a palidez que perdurava na face da jovem deu lugar à cor natural de sua pele. Preocupada, a criada perguntou:
- O senhor deseja que eu faça algo mais?
- No momento não. Quero apenas que não saia deste andar. Escolha um dos quartos de hóspedes, o mais perto deste, para, caso eu precisar de sua ajuda, possa vir o mais rápido possível.
- Assim será – disse ela, e saiu.
Acordada e ainda sem forças para sair da cama, a donzela o questionou:
- O que houve?
- O frio foi implacável contigo. Tive que tirá-la de lá.
Ela olhou para o alto, tentando resgatar os últimos momentos da sua permanência naquele buraco solitário e assustador. Não conseguiu resgatar tudo, apenas resquícios de lucidez.
- Como cheguei até aqui?
- Não lembras? Eu te trouxe no colo.
Ela fez uma pausa prolongada e informou:
- Estou com sono...
- Antes quero que tomes o conteúdo desta xícara: é chocolate quente.
Assim ela fez. Necessitava melhorar. Adormeceu olhando para o rosto dele, deitada e devidamente aquecida, tentando descobrir o que tinha
- O que houve comigo, senhora? - perguntou ela, um pouco melhor.
- Não sei ao certo, mas a senhorita quase morreu, e teria morrido, se ele não agisse rápido.
- Eu preferia morrer – disse ela, tentado se levantar.
- Não diga isso. Trata de ficar forte e não desobedecer mais a nenhuma ordem dele.
Assim se passaram alguns dias, entre os cuidados da criada e as visitas dele à noite, quando ela estava adormecida...
* Foto do livro. Adoro essa foto!
2 comentários:
Só agora tive tempo de vir ler com atenção este capitulo
:)
estou á espera do seguinte
beijo
Xana, senti a tua falta. Na segunda publico o IV, tá?! Bom fim de semana.Beijos
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